É tão ruim quando você tem tanto pra falar, tanto pra desabafar, tanto chorar. Nunca desejei tanto que cachorros pudessem falar.
É tão amargurado esse sofrimento de não sei o que, essa trava na garganta, essa vontade de morrer.
É tão triste não ter coragem mais pra nada, nem pra morrer, nem pra viver, nem pra escovar os dentes. Quem sabe inanição? Não, dói e eu tô sem coragem pra sentir dor, to sem coragem pra sofrer também. Daí de repente eles vem e me cobram carinho, uma late, o outro arranha... Me arranca um sorriso amarelo e uma reflexão: "quem vai cuidar de vocês se eu morrer agora?". É, meus pais, digamos, mas só eu que deixo subir na cama e sento no chão e deixo ser lambida.
Tudo isso deveria me trazer alegria, mas nada traz. Sorrir não significa ser ou estar feliz. Estar feliz não significa ser feliz. E o que é ser feliz?
Achei que seria poder dormir depois das 18h.
Então, não era isso.
Achei depois, que fosse brincar até tarde. Até foi um certo tempo.
Então pensei que seria a primeira menstruação. Acho agora que seria a última menstruação. Nem isso, nem aquilo.
Talvez uma roda grande de amigos. Aí você descobre que amigos de verdade não estão nas rodas. Triste.
Supus que fosse depois dos 15 anos ou segundo grau completo. Ledo engano.
Ah! então, com certeza, é depois da primeira noite de sexo. Não é!
Depois do primeiro baseado? Han-han.
Porra, na formatura do terceiro grau. Lógico! Lógico que não é, não foi, não será.
Um emprego. Não é. Não depois de três, se não foi antes não será agora.
As outras noites de sexo! Tá ai, como não pensei antes?! Até que são bem legais, mas não é bem lá que está a felicidade. Seria muito injusto só alguns segundos de felicidade.
Que merda! Então onde estará?
Acho que está em tudo isso, mas principalmente não está em nada disso. Está em algum lugar em você, intocável, que só você vê, que só você sente e que só se tornará palpável quando você parar de procurá-la nessas coisas.
Mas talvez ela ainda esteja lá nas brincadeiras até tarde da noite quando você não procurava por ela incansavelmente. Acho que agora ela se escondeu e pede pra que você volte a brincar até tarde da noite sem preocupação, sem rancor, sem dor.
Ela está ai.
Desnude-se!
Ontem algumas crianças puxaram meu cabelo no onibus, e eu chorei. Mas o que doeu não foi necessariamente o meu couro cabeludo, o que doeu foi ver crianças com um preconceito que elas nem sabem porque têm.
Na verdade é o que doi todo dia. Doi os olhares, os comentários e até os puxões de cabelo. Essa ditadura de cabelos lisos, faz com que quem tem o cabelo "diferente" (porque existe um tabu pra dizerem que seu cabelo é crespo, portanto ele é "diferente, mas é tão bonito!") seja tratado como diferente. Sim, meu cabelo é diferente do seu porque meu DNA é diferente do seu, minha fibra e meu corte, tudo isso deixa meu cabelo diferente do seu, inclusive a minha escolha de não alisá-lo, me faz diferente de você. Mas respeito é igual!
Não espirrando desodorante em quem fede ou dando pastilhas de menta pra quem tem mal hálito. Então por que eu tenho que ser apontada, gozada e receber puxões de cabelo dentro do ônibus? Parece drama e eu deveria esquecer, afinal eram crianças. Mas o problema vem muito antes dessas crianças nascerem e é passado quase que pelo sangue. E até quando vamos ficar calados diante disso? Devemos modificar a raiz do problemas, educar as crianças hoje para que o adulto de amanhã não diga pro seu filho que ser diferente é feio. Até porque se todos os negros assumissem sua negritude, meu cabelo crespo não seria diferente, na verdade era o seu cabelo liso que seria.
O preconceito doi no corpo, mas doi muito mais na alma.